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Tendências para o mercado de biodiesel em 2020

Nos mais recentes leilões de biodiesel, os preços vem se mantendo acima do patamar inédito de R$ 3 por litro, em um momento do aumento da demanda pelo biocombustível e pela soja no mercado internacional. E como programado, o país avança na elevação do percentual obrigatório, com o início da vigência do B12 (12%), reforçando as dúvidas sobre qual será a trajetória dos preços este ano.

A alta teve um personagem de peso, a China. O país asiático, praticamente, interrompeu a compra de soja dos Estados Unidos, em meio à guerra tarifária com a administração de Donald Trump, o que turbinou as importações de grãos do Brasil. A China foi o destino de quase 80% da safra brasileira de soja em 2019, principal matéria-prima do biocombustível.

O aquecimento da safra de soja 2019-2020, contudo, conta como um fator positivo para conter a escalada dos preços. A especialista em Inteligência de Mercado da INTL FCStone, Ana Luiza Lodi, entende que uma queda já no primeiro semestre é factível.

“O crescimento da oferta do grão para esmagamento resultará em uma maior disponibilidade de óleo de soja no mercado. Historicamente, nos meses de março, abril e, especialmente, maio é quando acontece mais esmagamento de soja. Sendo assim, a expectativa é que o preço do biodiesel fique abaixo de R$ 3 nos próximos meses”, explica.

A INTL FCStone antevê uma safra recorde, de 124,2 milhões de toneladas de soja em 2019-2020. Em outubro, o preço médio do litro ultrapassou pela primeira vez a casa dos R$ 3, negociado a R$ 3,075. De lá para cá, foram realizados mais dois leilões (L70 e L71), com o biodiesel negociado a R$ 3,012 e R$ 3,002, respectivamente. Os leilões são bimestrais e há mais quatro previstos para este ano.

O cenário, contudo, ainda é de incertezas. Os EUA e a China firmaram um acordo, ainda não detalhado, no qual Pequim promete comprar ao menos US$ 12,5 bilhões adicionais em produtos agrícolas dos americanos em 2020, com potencial efeito contrário na demanda por soja brasileira.

“Quanto ao segundo semestre, as dúvidas permanecem. É cedo para dizer como a China irá se comportar saindo da peste suína africana e o que ficou acertado no acordo com os EUA”, afirma Ana Luiza Lodi. A analista acredita que a soja brasileira continuará com espaço no mercado chinês.

O país asiático foi o epicentro da contaminação pelo novo coronavírus ao mesmo tempo em que teve que lidar com a peste suína africana, que atingiu a produção de porcos no país. O sucesso no controle das doenças – o número de novos casos de Covid-19 está em queda –, será o sinal para recuperação da atividade econômica interna na China e, neste cenário, o preço do biodiesel tende a subir.

“Acreditamos que nos próximos meses, o mercado interno chinês se normalizará voltando ao patamar de consumo pré-coronavírus, o que deverá sustentar o aumento da cotação da soja em Chicago”, afirma Erickson Oliveira, analista de mercado da consultoria Céleres.

O analista lembra que a desvalorização do real colabora para a exportação e a Céleres acredita que o câmbio deve permanecer acima do patamar de R$ 4,20 ao longo de 2020. Nesta quinta (5), o dólar fechou a R$ 4,65, a despeito de três operações de swap cambial, no valor equivalente a US$ 3 bilhões, promovidas pelo Banco Central.

Para Oliveira, esses fatores, combinados com o aumento da demanda interna por biodiesel, devem sustentar os preços do biocombustível acima de R$ 3, nos próximos leilões.

Leilões de biodiesel marcados por questionamentos
Em anos recentes anos, várias empresas do segmento de biodiesel paralisaram suas atividades, em especial as de menor porte, que tiveram dificuldades em ofertar o biocombustível a preços competitivos nos leilões.

De acordo com a Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), “as companhias verticalizadas se mantêm economicamente mais estáveis que as pequenas, não verticalizadas. Contudo, há um movimento no sentido de tornar obrigatória a aquisição de biodiesel produzido pelos pequenos produtores, o que possibilitaria a sua manutenção no mercado”. A EPE publicou nesta semana um nota técnica sobre o mercado de biodiesel.

Nesta quarta (4), o projeto protocolado pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP/RS), trata exatamente desta questão. Determina que o biodiesel voltado à adição obrigatória, necessariamente, deve ser fabricado a partir de matérias-primas nacionais, preferencialmente, produzidas por agricultores familiares.

Além de fixar, em lei, o calendário atual de adição de biodiesel, o deputado propõe a extensão da política para atingir o B20 até 2028.

Unidades de pequeno porte chegaram a pedir a impugnação do L71 – o 71º Leilão de Biodiesel promovido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) –, mas desistiram.

As empresas Biopar Parecis, Bio Vida, Brejeiro, Prisma e Unibras entendiam que a portaria MME nº 311/2018, que define produtores de pequeno porte e garante prioridades de compra, estaria sendo descumpridas. Elas desistiram das ações e o L71 foi homologado.

Antes desse episódio, houve também a anulação de etapas comerciais do L70, por conta de um pedido da Aliança Biocombustíveis. A usina instalada em Rondonópolis (MT) ocupava a lanterna do mercado de biodiesel, com capacidade instalada para fabricar apenas 3,6 milhões de litros por ano, segundo informações do BiodieselBr. (EPBR, 5/3/20)

A União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio) estima que serão adicionados 1,4 bilhão de litros de capacidade de produção do biocombustível em 2020. Além da necessidade de instalação de novas plantas, a tendência do mercado de biodiesel é diversificar as fontes de matéria-prima e desenvolver novas formas de produzir diesel renovável.

Nesta semana, entrou em vigor a elevação da mistura obrigatória de biodiesel no diesel de petróleo para 12%, o B12, de acordo com o cronograma aprovado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

“Com a mistura mínima obrigatória B12, estimamos que em 2020 serão consumidos cerca de 7 bilhões de litros de biodiesel”, explica Donizete Tokarski, superintendente da Ubrabio.

A expectativa representa um aumento de cerca de 1 bilhão de litros na demanda deste ano, um crescimento de 17% em relação a 2019 e está alinhada com a previsão da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), presente no Plano Decenal de Energia (PDE) 2029.

“Nossa perspectiva é que um novo marco regulatório seja construído nos próximos anos para continuidade da evolução gradual de 1% ao ano (a.a) para que, a partir de 2024, entre o B16 e, sucessivamente, com crescimento de 1% a.a, alcancemos o B20 em 2028”, conta Tokarski.

Esse plano está previsto no projeto de lei protocolado esta semana por Jerônimo Goergen, que amplia o cronograma obrigatório de entrada biodiesel no mercado para 2028, com o 20% de mistura (B20).

De acordo com a Ubrabio, oito unidades de produção estão em processo de ampliação, para adicionar mais 600 milhões de litros/ano à capacidade total. Outras oito usinas estão sendo construídas, incorporando 1,9 bilhão de litros/ano”.

Tokarski acredita que, ainda em 2020, o total de incremento entre ampliações e novas unidades será de 1,4 bilhão de litros/ano, elevando a capacidade de produção anual para 11,4 bilhões de litros.

Esse volume é suficiente para atender a demanda projetada pela EPE em 2029, mas sem folga. No plano decenal, estimativa é que a capacidade atinja 13,7 bilhões de litros no período.

Novas fontes de matéria-prima
A busca por novas fontes de matéria-prima para produção de biodiesel também pode ser uma alternativa para atender essa demanda crescente. Pelo menos 77% da produção do biocombustível têm como fonte o óleo de soja.  Para 2020, espera-se que sejam destinadas 9 milhões de toneladas de soja para produção de óleo, dos quais 53% serão destinados para a produção de biodiesel.

“Projetamos um leve aumento da ordem de 3% a 4% no uso óleo de soja no biodiesel brasileiro, em relação a 2019”, estima Erickson Oliveira, analista de mercado da consultoria Céleres.

Porém, para o analista, a relevância do grão tende a ceder espaço. “Parte do protagonismo da soja será suplantado pela gordura animal, ajudando a manter o setor competitivo”, explica. Atualmente, o sebo bovino é a segunda matéria-prima mais utilizada para a obtenção de biodiesel no Brasil.

Um dos exemplos é a JBS Biodiesel, braço energético da JBS, uma das líderes mundiais no processamento de proteína animal. A empresa é a maior produtora verticalizada de biodiesel a partir de sebo bovino no mundo, e possui duas unidades de produção.

“Para 2020, já temos aprovado investimento de R$ 13 milhões para modernização das nossas unidades produtivas em operação, localizadas em Lins (SP) e Campo Verde (MT)”, afirma o diretor da JBS Biodiesel, Alexandre Pereira.

O investimento vai permitir um incremento de aproximadamente 25% da capacidade produtiva atual. Em 2019, a JBS comercializou 274 milhões de litros de biocombustível, o que coloca o grupo entre os 20 maiores produtores de biodiesel do país.

A companhia está investindo R$ 180 milhões para construção de uma nova unidade, em Mafra, Santa Catarina, que utilizará gordura de frango e porco produzida na subsidiária Seara. “A nossa expectativa é muito positiva. O mercado de biocombustíveis vem crescendo de forma sustentável no Brasil”, acredita Pereira (EPBR, 5/3/20

Projeto de Jerônimo Goergen eleva adição de biodiesel para 20% em 2028

O deputado Jerônimo Goergen (PP/RS) protocolou nesta quarta (4) o PL 528/2020, que fixa em lei o calendário atual de adição de biodiesel e estende a política para atingir 20% (B20) até 2028. Goergen está propondo a extensão da política criada pela MP 647, de 2014, que originalmente definiu a mistura obrigatória em 7% (B7) e depois passou a ser ampliada por meio do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

O projeto de lei incorpora na legislação a política vigente do B15, previsto para entrar em vigor em 2023, mediante incremento anual de 1% no percentual de biodiesel – o B12 começou a valer nesta semana.

“Não se pode deixar de reconhecer que quanto maior o horizonte temporal do cronograma de adição obrigatória de biodiesel ao diesel vendido ao consumidor maior é a previsibilidade da sua demanda e, por via de consequência, menor é o risco para os investidores”, justifica o deputado no projeto.

Mas também estabelece um período de transição de 12 meses, a partir da promulgação da lei, para certificação do B20 em motores a diesel. Isso também foi feito com o B15, o que passou por análise técnica e especificação pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

A partir da validação do B20, o projeto autoriza a comercialização voluntária do diesel com 20% de biodiesel e estende o cronograma para 2028, com um novo incremento anual de 1%, partindo do B16, em 2024 até atingir o B20, em 2028.

Adicionalmente, obriga cidades com mais de um milhão de habitantes a utilizar B20, em um prazo de 24 meses, no transporte coletivo, após a validação do biocombustível. E, por fim, o PL leva para a legislação as definições de bioquerosene de aviação e diesel verde (categoria que inclui o HVO).

O PL de Jerônimo Goergen também prioriza a produção nacional. O biodiesel voltado à adição obrigatória, necessariamente, deve ser fabricado a partir de matérias-primas nacionais, preferencialmente, produzidas por agricultores familiares. E cabe ao governo federal garantir a execução dessa política (EPBR, 5/3/20)

HVO desponta como tendência para produção de diesel renovável
Paralelamente ao aumento da participação de outras matérias-primas na produção do biodiesel, o gradual aumento da substituição de diesel por outros tipos de biocombustíveis de fontes renováveis é apontado como um fator importante para aumento da capacidade de produção e atendimento ao mercado.

Neste cenário, o chamado diesel verde obtido a partir do hidrotratamento de óleo vegetal (HVO, na sigla em inglês) desponta como a principal opção nesta corrida tecnológica.

“A Ubrabio já vem participando ativamente das discussões com a ANP que está debruçada na estruturação do diesel verde e seu uso combinado com o biodiesel. Esperamos já para março que a ANP coloque em consulta pública essa regulamentação”, explica Donizete Tokarski, superintendente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio).

A nova resolução para especificação do HVO começou a ser elaborada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em agosto de 2019. A agência entende que, com o RenovaBio, há uma tendência de entrada de novos biocombustíveis matriz energética brasileira.

Tokarski aposta na utilização do HVO para formar uma mistura de três combustíveis, com diesel de petróleo e biodiesel convencional. O crescimento do uso dessa mistura ternária pode ser potencializada pelo RenovaBio, segundo ele.

“A ideia é que o biodiesel seja usado sempre em forma de misturas, seja com o diesel fóssil ou com o diesel verde. Defendemos essa evolução gradual da mistura e a inserção do diesel verde na matriz de combustíveis, para garantir cada vez mais sustentabilidade”, explica.

Atualmente, os HVOs representam o terceiro maior biocombustível em volume produzido no mundo e sua produção está crescendo a uma taxa mais rápida do que as observadas nas indústrias de etanol e do biodiesel convencional (tecnicamente classificados como éster). Veja um resumo sobre os diferentes biocombustíveis no fim da matéria

De acordo com a Empresa de Pequisa Energética (EPE), entre 2011 e 2018, a produção de éster cresceu 1,7% ao ano (a.a.) no mercado europeu, enquanto o HVO avançou a um ritmo de 37,1% a.a. O Brasil ainda não possui plantas para a produção do diesel verde.

Em uma nota técnica publicada esta semana, a EPE aborda oportunidades para a inserção do HVO no mercado nacional e indica que poderia ser uma solução para a instabilidade da mistura de biodiesel e diesel, ajudando a evitar a formação de depósitos em filtros e injetores de veículos pesados.

A discussão ganha força com a elevação do teor de biodiesel para 15% (B15), já programada para ocorrer até 2023.

“O uso do diesel verde, HVO, poderia contribuir para a melhoria da estabilidade da mistura que compõe o diesel B. Este biocombustível pode ser utilizado em motores diesel da frota atual sem quaisquer modificações, assim como em motores a serem comercializados a partir de 2023”, explicam os especialistas da EPE.

O diesel verde também contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa em cerca de 50%, em relação ao diesel fóssil, podendo atingir até 90%, segundo os produtores.

O que é o diesel verde?
Informações adaptadas da nota técnica Combustíveis renováveis para uso em motores do ciclo Diesel (.pdf), publicada em março de 2020, pela EPE.

Em regra, biodiesel é todo combustível derivado de biomassa renovável, como a soja. O diesel verde é, portanto, um tipo de biodiesel, mas obtido a a partir de outros processos de fabricação, como o hidrotratamento de óleo vegetal, o HVO.

Explica a EPE: “diesel verde é um combustível renovável, formado por uma mistura de hidrocarbonetos com composição química semelhante à do combustível fóssil” ou drop in, isto é, são equivalentes aos combustíveis de petróleo.

Já o que é comumente chamado de biodiesel – esse que vai na mistura obrigatório –, são os ésteres metílicos. Para manter a convenção, neste texto, são chamados de biodiesel.

O diesel verde pode ser obtido por diferentes processos. São eles:

HVO, sigla em inglês para hidrotratamento de óleo vegetal: é o combustível obtido da hidrogenação de óleos, que pode ser de soja, de palma ou, apesar do nome, gordura animal. Por esse processo, podem também ser fabricados combustível para aviação, bionafta e biopropano.Apresenta maior estabilidade de armazenamento, melhores propriedades de fluxo a frio e pode ser usado em motores a diesel sem os limites ou modificações de mistura exigidos pelo éster de ácidos graxos [o biodiesel convencional].

Fischer-Tropsch: é uma tecnologia para a produção de combustíveis sintéticos, amplamente utilizada na Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial, sendo posteriormente aprimorada. Envolve a síntese química a partir de matérias-primas renováveis ou não, como biomassa (biomass-to-liquid, BTL), carvão (coal-to-liquid, CTL) e gás natural (gas-to-liquid, GTL). Para ser considerado diesel verde, é claro, precisa ser produzido a partir de biomassa renovável.

Fermentação: os processos fermentativos convertem material orgânico em diversos produtos, incluindo similares aos derivados de petróleo. Um exemplo é o uso da levedura Saccharomyces cerevisiae, utilizada para transformar o caldo de cana em etanol, durante o processo de fermentação nas usinas. Possibilita o uso desse microrganismo para produção de uma substância chamada farneseno, hidrocarboneto similar ao diesel – também é chamado de diesel de cana.

Oligomerização de álcool etílico ou isobutílico: para o caso dos biocombustíveis, o exemplo de oligomerização é a formação de combustíveis renováveis, de estrutura similar aos fósseis, a partir de álcool de cadeia curta. Esta rota é conhecida comercialmente como ATJ (alcohol to jet), usada na produção de diesel e querosene de aviação renováveis (EPBR, 5/3/20).  Brasil Agro

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