Nos últimos meses, operações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e das polícias estaduais trouxeram à tona um problema que ameaça a segurança do consumidor e a credibilidade do setor de combustíveis: a adulteração de etanol com metanol. A prática, ilegal e perigosa, voltou a ser detectada em alguns estados brasileiros, inclusive em distribuidoras e postos de revenda.
Etanol x Metanol: duas moléculas parecidas, mas com destinos bem diferentes
O etanol é o combustível renovável produzido a partir da cana-de-açúcar, do milho ou de outras biomassas vegetais. É o mesmo álcool que chega às bombas dos postos brasileiros e também o utilizado na formulação da gasolina comum. Biodegradável e de baixa toxicidade, ele é considerado um dos pilares da matriz energética limpa do país.
Já o metanol é um álcool sintético, geralmente obtido do gás natural ou de processos industriais com carvão. É um produto altamente tóxico — sua ingestão ou inalação pode causar cegueira e até morte. Apesar de ser usado na indústria química e, em alguns países, como combustível em competições automobilísticas, o metanol é proibido para uso em veículos no Brasil.
As semelhanças químicas entre os dois produtos — ambos incolores e voláteis — dificultam a detecção visual, o que facilita fraudes. Segundo a ANP, “o metanol é usado por adulteradores para baratear o custo de produção do combustível, em prejuízo da qualidade, da segurança e da saúde do consumidor”.
O que está sendo feito para combater as fraudes
A ANP intensificou as ações de fiscalização e coleta de amostras em todo o país. Os laboratórios credenciados estão utilizando equipamentos mais sensíveis para identificar traços de metanol, mesmo em pequenas quantidades. Além disso, foi reforçado o Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis (PMQC), que realiza testes periódicos nas bombas de todo o território nacional.
Outro avanço vem do uso de tecnologia blockchain para rastrear a origem do etanol hidratado, desde a usina produtora até o posto de revenda. O objetivo é criar um selo digital de autenticidade, impedindo que o produto seja substituído por adulterantes ao longo da cadeia. Em paralelo, a Receita Federal e o Ministério de Minas e Energia têm cruzado dados fiscais e logísticos para identificar movimentações suspeitas, especialmente nas regiões onde há maior incidência de fraudes.
Indústria reage com transparência e tecnologia
As usinas e distribuidoras sérias do setor sucroenergético também estão fazendo a sua parte. A Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) reforçou, em nota, que o uso de metanol no etanol automotivo é crime e que o setor apoia integralmente as ações da ANP. Empresas do setor têm investido em marcadores químicos e lacres inteligentes nos tanques de transporte, capazes de indicar qualquer violação de carga. Há ainda projetos-piloto que utilizam IA (inteligência artificial) para identificar padrões anormais de composição química em combustíveis coletados em campo.
Direitos do consumidor e consequências legais
O Código de Defesa do Consumidor e as leis ambientais classificam a adulteração de combustível como crime grave. Postos flagrados vendendo etanol com metanol estão sujeitos à interdição imediata, multas elevadas e perda do cadastro na ANP. O consumidor, por sua vez, deve ficar atento: combustíveis adulterados podem causar danos severos ao motor, aumento do consumo e risco de incêndio. Caso desconfie de irregularidade, o motorista pode denunciar anonimamente à ANP pelo 0800 970 0267 ou pelo aplicativo ANP Mobile.
Etanol brasileiro: símbolo de uma matriz energética limpa
O Brasil é referência mundial na produção e uso do etanol como biocombustível sustentável, com tecnologia consolidada e controle rigoroso em toda a cadeia produtiva. A presença de metanol, portanto, não representa o padrão do setor — mas sim ações pontuais de criminosos que tentam lucrar às custas da saúde pública e da reputação de uma das maiores conquistas da energia verde nacional.
Canal-Jornal da Bioenergia