Setor de energia fotovoltaica precisa de mão de obra qualificada

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Neste ano, agora no segundo semestre, o Brasil atingiu a marca de 100 MW de potência acumulada em sistemas de microgeração e minigeração distribuída solar fotovoltaica instalados em residências, comércios, indústrias, edifícios públicos e na zona rural. De acordo com o mapeamento realizado pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), a fonte solar fotovoltaica lidera com folga o segmento de microgeração e minigeração distribuída, com 99% das instalações do País. Ainda conforme a entidade, há no país 12.520 sistemas solares fotovoltaicos conectados à rede, trazendo economia e engajamento ambiental a 13.897 unidades consumidoras, somando mais de R$ 850 milhões em investimentos acumulados desde 2012, distribuídos ao redor de todas as regiões do Brasil.

Conforme relatório da Agência Internacional de Energias Renováveis (Irena), o setor de energia renovável empregou 9,8 milhões de pessoas em todo o mundo, liderado pela fonte solar, com 3,1 milhões de empregados. Segundo estimativa do presidente da Absolar, Rodrigo Lopes Sauaia, até 2018 devem ser gerados dezenas de milhares de empregos e para 2030 serão cerca de 100 mil empregos, considerando todas as áreas funcionais e os profissionais que dedicam seu tempo a algum trabalho de energia solar. “Essa é uma meta da Absolar, projeção que conseguiremos atingir se houver engajamento do governo para estruturar e fazer dela uma realidade.

O setor solar fotovoltaico cresceu mais de 300% em 2016, ano em que o PIB caiu 3,6%. Assim, ele representa uma oportunidade tanto para empresários quanto para os próprios estudantes e profissionais que queiram participar desse mercado, sejam vindos de outro setor ou não.

Por trás de toda essa produção, há uma enorme gama de profissionais que trabalham para garantir investimentos adequados, projetos bem feitos e execuções precisas, que atendam às necessidades específicas de cada consumidor. Entretanto, com o crescimento do setor e as perspectivas futuras, é preciso reavaliar certos aspectos para garantir que haja capacitação adequada para que a geração de energia a partir desta fonte renovável continue crescente.

O engenheiro eletricista, civil e de segurança do trabalho e diretor da Stonos Desenvolvimento Criativo, Pedro Provázio, considera importante a mão de obra qualificada em todos os níveis, ou seja, técnico, operacional e comercial, no sentido de estruturar a geração de energia elétrica solar fotovoltaica de forma profissional e segura. “Isso proporciona aos investidores a confiança nos retornos que podem obter ao optarem por este modelo de geração de energia elétrica e à matriz elétrica brasileira uma parcela confiável e segura proveniente do recurso solar, que é a fonte de energia renovável mais abundante do país. Para se ter uma ideia, o potencial brasileiro de geração de energia elétrica a partir da fonte solar é superior a 200 vezes a capacidade de geração de energia elétrica já instalada em toda a história do país até dos dias de hoje.”

De acordo com Raphael Pintão, diretor da NeoSolar Energia, o mercado fotovoltaico brasileiro conta com quantidade escassa de profissionais. “Poucos profissionais realmente estão qualificados o suficiente. Pior que isso, muitos destes se propõem a projetar e instalar, mesmo sem estar preparado. Isso traz risco à segurança e perda de performance no curso e longo prazo”, analisa.

Um profissional bem preparado é essencial para que o sistema fotovoltaico atinja seu melhor desempenho e consiga atender às necessidades do usuário. Pintão considera três aspectos importantes: performance, durabilidade e segurança. “Um projeto não otimizado ou instalação mal feita prejudicam o sistema pelo resto de sua vida útil. Aqui não se pode economizar: uma perda de 3 ou 5% de energia multiplicada por 25 a 40 anos é um prejuízo enorme. O projeto ou instalação incorretos, além de prejudicar a eficiência, prejudicam fortemente a durabilidade do sistema. Uma manutenção que deveria custar pouco, acaba virando transtorno. Um material que deveria durar 10 ou 25 anos, dura 1 ou 3 anos. Por último e até mais importante, o projeto e instalação é que garantem a segurança. Há riscos seríssimos, como incêndio, desabamentos, soltura de placas e outros tipos de acidentes e incidentes”, menciona.

Profissionalização

Para a execução de sistemas fotovoltaicos, o profissional responsável é o engenheiro eletricista, que tem habilitação e formação adequada para o desenvolvimento de projetos de energia elétrica. De maneira mais ampla, pensando em toda a cadeia, o setor tem atraído profissionais de engenharia, administração, finanças, contabilidade e área jurídica. Para a execução técnica, a restrição é que os profissionais sejam engenheiros eletricistas ou técnicos da área de eletricidade.

Rodrigo Sauaia explica que as faculdades de engenharia do Brasil ainda não têm se dedicado à profissionalização para o setor de energia solar fotovoltaica, já que trata-se de um segmento novo. O que já existem são universidades pioneiras em pós-graduações e especializações para energias renováveis, sendo algumas específicas para fotovoltaica. ”É importante que engenheiros eletricistas tenham contato com essas tecnologias renováveis, com as características e particularidades, para que aprendam a fazer projetos, uma vez que estão se tornando cada vez mais frequentes e, a longo prazo, para que a matriz energética avance por meio delas”, pondera.

De acordo com o presidente da Absolar, a especialização fora do país não é a única opção, apesar de que o estudo no exterior é uma oportunidade para conhecer de perto mercados mais maduros na adoção da tecnologia. “Para quem tem interesse em formação complementar no exterior, sugiro os Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Espanha, Itália, França, Austrália, Japão e China, que tem se tornado um polo de desenvolvimento tecnológico fotovoltaico.”

Raphael Pintão considera que há muitos cursos disponíveis para o setor fotovoltaico, porém a maioria é inadequada ou insuficiente. “Vemos cursos muito bem promovidos e acessíveis, porém superficiais e insuficientes. Não podemos esquecer que tratamos de sistemas físicos, que envolvem eletricidade e estruturas, onde moram e trabalham pessoas. Uma palestra, curso on-line ou webinar servem para um primeiro contato, porém, a experiência e vivência prática que fazem a diferença. Para projetos é a mesma coisa, discutir um caso é bem mais importante do que conhecer uma ferramenta de projetos.”

Apesar dos cursos técnicos para projetistas e para instaladores de sistemas fotovoltaicos oferecidos no Brasil, Pedro Provázio considera que a certificação ainda precisa ser mais bem definida, principalmente, para os cursos formação de instaladores, com a validação pelos Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (Crea) de cada estado, para que exista um padrão de qualidade. “Outro ponto a ser destacado é a necessidade de uma movimentação das instituições de ensino superior dos cursos de engenharia para estruturação de uma grade curricular com disciplinas voltadas à energia solar fotovoltaica, incluindo aulas em laboratórios, de modo a proporcionar aos alunos uma aproximação às práticas aplicadas na concepção, instalação e manutenção de sistemas fotovoltaicos. Hoje em dia poucas instituições contam com esses recursos e ementas, sendo que a maioria fica restrita a atividades de extensão, de curta duração, no ramo da energia fotovoltaica.”

Pedro Provázio diz ainda que o consumidor tem à disposição portais na internet com catálogos das empresas atuantes no ramo de energia solar fotovoltaica em cada estado, com a respectiva qualificação proveniente da avaliação de outros consumidores que já contrataram o serviço, meio pelo qual pode certificar-se de estar contratando o profissional certo. “Também é importante a análise do registro da empresa e dos profissionais junto ao Crea do respectivo estado onde atuam, para validação das atribuições dos mesmos. E, finalmente, ficar atento aos materiais e aos produtos aplicados pelos profissionais na solução apresentada para a prestação do serviço, uma vez que a garantia, a assistência técnica e a qualidade dos materiais e dos produtos devem atender aos padrões normatizados pelas concessionárias de distribuição de energia elétrica e ao padrão de exigência do próprio consumidor.”

Mercado

A mão de obra qualificada em energia solar fotovoltaica está escassa em todos os níveis, desde a parte técnica e operacional, composta pelos instaladores e engenheiros, até a parte comercial de venda e pós-venda e de representantes comerciais dos serviços e dos equipamentos relacionados a este setor. Pedro Provázio entende que os três pilares com maior necessidade de reforço são desenvolvimento de habilidades e estudo de casos de sucesso, para aplicar as melhores soluções práticas para implantação dos sistemas fotovoltaicos e as mais viáveis financeiramente aos investidores; conhecimento das legislações, tributações, composições tarifárias e resoluções normativas aplicáveis à geração distribuída de energia elétrica a partir de fontes renováveis, para que possam surgir arranjos que explorem o potencial energético brasileiro se valendo de todos os benefícios e incentivos disponíveis e estabelecidos pelo governo; e, finalmente, o domínio da língua inglesa, para que os profissionais possam se capacitar com o material disponível referente aos estudos e cases internacionais sobre as diversas aplicações e soluções para sistemas fotovoltaicos, já que o ramo da energia solar fotovoltaica no Brasil está atrasada em mais de dez anos em relação aos mercados líderes neste segmento.

Para o futuro, a expectativa da Absolar é de que o setor continuará crescendo como nos últimos anos. Nesse caso, haverá mão de obra suficiente para atender a demanda? Rodrigo Sauaia estima que serão gerados milhares de novos empregos, já que o setor está em franca expansão. Para isso, será necessária a capacitação de mão de obra para que projetos e sistemas tenham qualidade, segurança e durabilidade. “Há muito espaço para programas de capacitação profissional, desenvolvimento de escolas técnicas, universidades e centros de formação. Mas, com certeza, temos grandes passos para a formação desses profissionais.”

Pintão acredita que serão necessários mais engenheiros com conhecimento específico em solar fotovoltaica e instaladores qualificados para a execução de obras. “Muitos engenheiros e eletricistas projetam e instalam sistemas sem conhecimento especifico, mas quem conhece sabe que não é o suficiente e entende como é difícil encontrar um bom profissional. Esse problema só deve aumentar”, projeta.

Insumos

Para o Brasil estruturar a indústria do sistema fotovoltaico, com linhas de montagem de módulos e de inversores de corrente elétrica e com plantas para fabricação de alguns componentes aplicáveis a esses dois equipamentos além de outros, como às estruturas de sustentação e aos dispositivos de proteção e conexão, Pedro Provázio entende que é necessário que o país garanta a contratação, através dos leilões de energia, de pelo menos 2 GW por ano, baseado em cálculos da Absolar. Além da demanda, para tornar os produtos brasileiros competitivos frente aos importados, é preciso racionalizar a carga tributária para a cadeia produtiva nacional. “Enquanto isso não ocorre, os módulos fotovoltaicos brasileiros chegam a custar o dobro do preço de um módulo importado”, lamenta.

Do mesmo modo, Raphael Pintão comenta que a produção de insumos brasileiros tem atendido a demanda parcial e pontualmente. “As estruturas metálicas de fixação já tem maior presença no país. Painéis solares são apenas montados localmente, mas usam células importadas. Inversores praticamente todos vem montados ou pré-montados de fora do país, assim como a maioria dos acessórios específicos de solar.” Ele afirma que a qualidade não é ruim, apesar de haver dúvidas pelo tempo em uso ser baixo perto da vida útil de 25 anos. “Um problema maior tem sido os preços, uma vez que a maioria dos insumos nacionais tem custo superior aos importados, com exceção das estruturas metálicas“, finaliza.

 

Ana Flávia Marinho-Canal-Jornal da Bioenergia

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